Processos contra médicos se multiplicam e advogado
Walter Ceneviva recomenda prevenção
para evitar problemas
Motivo do aumento do número de ações judiciais é mudança do relacionamento do médico com o paciente
O advogado Walter Ceneviva tem dado atenção
ao exercício da medicina no Brasil, desde a
preparação universitária, até a defesa do médico
por fatos do exercício profissional. Atualmente as
ações contra os profissionais da Saúde se tornam
cada vez mais numerosas. Às vezes transformam
o paciente de hoje no adversário de amanhã. A
quantificação crescente do número de médicos,
a diversidade dos clientes, o relacionamento
distante afastam o convívio próximo e o diálogo.
O médico de hoje, com frequência, é remunerado
por entidade à qual o cliente é filiado, também
mudando o perfil psicológico desse contato.
O relacionamento amigável e próximo entre
médico e paciente deixou de existir em grande
número de casos. Surgiu com a especialização
profissional, a exigência de exames periciais
variados, a impessoalidade do atendimento.
"O distanciamento abre campo para que surjam
processos disciplinares, justos ou injustos, em
números crescentes", diz Ceneviva.
Entre muitos, colhe exemplo em processo movido
contra profissional que implantou stent fabricado
por indústria que lhe pagou comissão por ter prescrito produto compatível com a situação
diagnosticada. Os exemplos são os mais variados,
gerados em parte pela impessoalidade do contato
entre profissional e cliente.
Qualificação insuficiente
Um dos problemas decorre da multiplicação
indiscriminada de faculdades de Medicina
que formam profissionais com qualificação
insuficiente. Outro, vem da Medicina
multidisciplinar, que, por exemplo, pode levar
paciente idoso cardíaco a ser atendido não só
pelo cardiologista, mas também por geriatra,
endócrino ou pneumologista. Esses exemplos,
entre tantos, embasam a recomendação
de Walter Ceneviva de que o médico não
se esqueça de que, eventualmente, pode
vir a ser processado pelo paciente, justa
ou injustamente.
Há pontos vulneráveis a serem evitados. Por exemplo: aceitar “presentes” ou vantagens vindas da comercialização do produto, que possam ser mal interpretados, em face da conduta adotada. O mesmo se diga da qualidade dos medicamentos prescritos e de sua adequação correta ao problema detectado.
Orientações
O especialista considera vital que o médico deixe claro e registrado, para o paciente, quais são o prognóstico do tratamento, o risco existente. “Não prometa milagres”, pois pode levar a processo por imputação de “erro médico” ou “conduta inadequada”, sob alegados danos para a saúde do cliente. O risco também é produto da relação impessoal, com distanciamento entre as duas partes, ao se envolverem em um procedimento disciplinar ou em juízo.
Ceneviva conclui dizendo que, embora seja sempre possível o conflito ético, a modificação crescente do relacionamento, entre profissionais médico e seus clientes, precisa ser levada em conta. E como na medicina um bom caminho é a prevenção. O médico, para evitar dissabores, disciplinares ou judiciários, precisa, nestes tempos novos, além dos cuidados próprios da ética profissional, compreender efeitos das mudanças sociais nos problemas da relação com o cliente. O fenômeno gerado pela quantificação de médicos, pacientes e procedimentos impõe maior cuidado para o profissional, a ser enfrentado com coragem, destemor e lealdade.
Fonte: Jornal SBC 153 · Abril · 2015