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Vitória da cardiologia brasileira
Antonio Carlos Palandri Chagas
PRESIDENTE DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA
A grande preocupação dos cardiologistas brasileiros é, há
tempos, o impressionante número de mortes por doenças
cardiovasculares, 300 mil por ano, o que torna o coração o
principal responsável pelos óbitos no País. A preocupação
cresceu com o aumento dos fatores de risco, a população mais
obesa, o crescimento do número de hipertensos, a melhor condição
econômica que aumenta o consumo de alimentos e nem sempre dos
mais saudáveis com a urbanização crescente, que se reflete no
estresse, os infartos precoces, que vitimam também os jovens e
pela poluição ambiental, que agride sem apresentar sintomas.
Os números do Ministério da Saúde comprovam pela primeira vez,
que a longa e árdua luta desenvolvida pelos mais de 12 mil
médicos filiados à Sociedade Brasileira de Cardiologia e pelas
autoridades governamentais, começa a apresentar resultados e
marcantes.
O índice de redução de óbitos indica que por ano 61.500 mortes
são evitadas. São outros tantos trabalhadores, mulheres também,
agora arrimo de família, que deixam de morrer devido às
campanhas que a SBC tem realizado, com grande apoio da imprensa.
Chega a ser cansativo o número de vezes que reunimos médicos nas
Capitais e grandes cidades do País para medir a pressão e contar
como a “doença silenciosa”, a hipertensão, representa um risco
de morte; de como invadimos “Shopping” para medir o colesterol e
distribuir folhetos e até mesmo, fita métrica na mão, fizemos
com que médicos e enfermeiros medissem a cintura abdominal das
pessoas, alertando que mais de 92 centímetros já se torna fator
de risco para enfarte.
A SBC faz campanhas há muitos anos e mais ainda. Com apoio dos
produtores de frutas chegamos a “confiscar” maços de cigarro nas
ruas e trocá-los por maçãs, no “Dia Nacional contra o Tabaco” e,
recentemente, promovemos um forum com a indústria
automobilística, a Universidade, as Prefeituras e o Ministério,
para alertar que a defesa do Meio Ambiente vai além da
preservação das florestas e que, em cada dia de poluição numa
cidade como São Paulo, crescem as ocorrências cardíacas.
A Cardiologia brasileira, uma das mais desenvolvidas, se sentia
frustrada ao perceber que, enquanto no Primeiro Mundo caía a
mortalidade cardíaca, o esforço brasileiro não levava ao mesmo
resultado. Foi por isso que a SBC se aliou ao Ministério da
Saúde, passou a discutir em Brasília as linhas mestras de uma
política nacional de Saúde.
Foi esse trabalho, de pesquisa, inclusive, que mostrou a
existência de 50% dos brasileiros hipertensos, que nem sequer
sabiam que eram doentes e foi a SBC quem instou para que os
hipertensivos fossem disponibilizados em todos os postos de
saúde, onde os médicos foram orientados sobre a importância de
medir a pressão arterial de todo paciente que se apresenta.
Ainda agora, Ministério e sociedade médica trabalham juntos para
controlar a Doença de Chagas, para bloquear a transmissão da
moléstia, identificar os chagásicos existentes e garantir o
diagnóstico precoce, que pode significar a sobrevida de até 20
anos para os já infectados. Também Bolívia, Argentina, Colômbia
e até a Espanha, que através dos imigrantes hispanoamericanos
importou a doença, passaram a se beneficiar da experiência e da
pesquisa brasileiras.
Também com o Ministério e as sociedades de Pediatria e
Reumatologia, foram criadas diretrizes para diagnostico e
tratamento da doença reumática, doença da pobreza, que vitima os
pacientes por toda uma vida e que, às vezes, necessitam de até
três cirurgias cardíacas. Projeto conjunto é também o da Saúde
do Homem, que une Ministério, sociedade de Cardiologia, Urologia
e Psiquiatria, na prevenção de doenças como câncer de próstata,
disfunção cognitiva e acidentes cérebrovasculares. Nem tudo foi
feito, porém, para o futuro, queremos projeto semelhante para a
Saúde da Mulher, que cada vez mais apresenta risco
cardiovascular.
A notícia da primeira redução nacional da mortalidade cardíaca
confirma que tudo é possível quando se alia vontade política da
autoridade governamental, apoio da imprensa, que sempre divulgou
nossas campanhas e o empenho de toda uma categoria profissional
voltada para a preservação da Saúde e da vida, uma categoria
que, com muito orgulho, tenho a honra de ter liderado nos dois
últimos anos, como presidente da Sociedade Brasileira de
Cardiologia.

Jornal do Brasil | Sábado, 21
de Novembro de 2009. |