POR UMA SAÚDE PÚBLICA HUMANA E DE QUALIDADE
Por que a Saúde no Brasil precisa
mudar? –
subsídios da Sociedade Brasileira de Cardiologia aos
candidatos à Presidência da República
O aumento do
número das Doenças Cardiovasculares (DCV) e do número de mortes
que elas causam é registrado no mundo inteiro, mas o crescimento
tem sido maior nos países em desenvolvimento e na América
Latina. Os organismos internacionais afirmam que, entre todos os
países, o Brasil é o que terá maior aumento das DCV até o ano de
2040, se não investir rapidamente em programas de prevenção e na
melhoria do atendimento.
Hoje mesmo, o Brasil já ostenta o triste título de “campeão
mundial” de internações por insuficiência cardíaca e essas
internações têm um custo financeiro imenso para o governo e em
vidas que são ceifadas. A outra consequência é a perda da força
laborativa e os custos para a previdência social.
O Ministério da Saúde tem grande sucesso no tratamento das
doenças infecciosas, como Febre Reumática, Doença de Chagas e
AIDS, é eficaz igualmente nas campanhas de vacinação, mas o
controle das doenças cardiovasculares ainda é uma verdadeira
tragédia no Brasil.
O Brasil é campeão mundial de hospitalizações por insuficiência
cardíaca e isso acontece por dois motivos básicos:
a) porque a
maioria dos Postos de Saúde não recebe medicação específica para
tratamento de insuficiência cardíaca.
b) porque, assim que a crise é debelada, o paciente recebe alta
e volta para casa sem medicamentos e, principalmente, não há
acompanhamento, o que faz com que logo tenha outra crise e
retorne ao mesmo hospital.
Essa
deficiência no binômio atendimento/prevenção encurta a vida dos
pacientes, aumenta enormemente o gasto público e é a causa
básica de o Brasil ter hoje 315 mil mortes anuais devido a
doenças cardiovasculares.
Infelizmente, o que está posto para a insuficiência cardíaca é
apenas um exemplo, que se repete no caso do infarto do miocárdio
e do acidente vascular cerebral. Bem ou mal atendido, assim que
melhora, o paciente recebe um aperto de mão e a informação: “O
senhor está melhor, teve alta hospitalar e passe bem”. Não há
acompanhamento do caso.
O problema da má gestão da Saúde Pública é decorrência do que o
leigo chama de “o barato que sai caro”. Outro exemplo: o governo
fornece stents para serem colocados dentro das artérias
afetadas, mas não a medicação que impede que a artéria volte a
fechar. Resultado: em poucos meses o paciente volta a ser
internado para receber outro stent e o custo direto da nova
hospitalização é muito alto, mesmo sem considerar o prejuízo
social resultante da perda dos dias de trabalho, que também
acabam pesando ao governo, já que são pagos pelo INSS.
Para os cardiologistas que vivem o dia-a-dia dos
prontos-socorros e hospitais, o que falta é “PREVENÇÃO”.
Cansamos de ser chamados a inaugurações de hospitais, cuja
construção dá votos, mas que seriam desnecessários se mais fosse
investido na prevenção e no acompanhamento dos doentes. Eles
voltam para as favelas tão desassistidos e sem orientação como,
no passado, voltava a criança subnutrida que, depois de
alimentada com soro, era devolvida ao mesmo sistema de vida que
a tinha tornado raquítica.
Hospital é a última instância a ser procurada; é urgente a
organização de uma rede ambulatorial capaz de dar suporte às
doenças crônicas, é urgente um plano de redução dos fatores de
risco geradores dessas doenças. A crise dos hospitais é reflexo
da falta de ambulatórios e de logística para acompanhar esses
pacientes.
O Brasil tem todas as condições para prevenir as doenças
cardíacas, para identificar e tratar dos hipertensos, o que é
extremamente barato, para identificar quem tem alto índice de
colesterol e oferecer medicação para baixá-lo, para combater a
obesidade que se torna epidêmica. A resposta são programas como
o “Saúde da Família” que precisa ser incentivado.
Para dinamizar esses programas de prevenção, entretanto, é
preciso maior financiamento da Saúde no Brasil, pois dar saúde
custa dinheiro. Não é necessária uma imensidão de recursos, o
que é vital é a melhoria da gestão dos recursos atualmente
disponíveis. Da mesma forma que o adágio recomenda que “não se
dê o peixe, mas se ensine a pescar”, em Medicina, o importante
não é só “curar a doença, mas evitar que a pessoa adoeça”.
A Sociedade Brasileira de Cardiologia reitera que o Brasil tem
todas as condições para reduzir drasticamente as mortes por
cardiopatias e para evitar que, no futuro, quantidades imensas
de dinheiro sejam despendidas em procedimentos que poderiam ter
sido evitados com prevenção adequada. Em nome de 11 mil
cardiologistas com vivência dos problemas de saúde de todos os
Estados brasileiros, a SBC está disposta a colaborar para acabar
com as falhas do atendimento cardiovascular. Nada queremos
receber em troca, além da satisfação de saber que, finalmente,
os brasileiros vão parar de morrer por causas evitáveis com um
pouco de investimento e cuidado.... antes que a cardiopatia se
instale.
Prezados candidatos à Presidência, estamos gritando por socorro
em nome das milhares de vítimas de doenças cardiovasculares que
morrem ou têm sua qualidade de vida comprometida. Estamos
oferecendo toda nossa massa crítica de especialistas e
instituições para sugerir e implementar políticas públicas para
controlar as novas epidemias – as doenças cardiovasculares.
Jorge Ilha Guimarães
Presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia
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