Artigo Científico

Eficácia do controle da freqüência cardíaca em portadores de fibrilação atrial persistente: comparação entre o controle permissivo e rígido da freqüência cardíaca – Estudo RACE II

Dr.Ricardo C.Moraes
Dr.Caio Cesar F. Fernandes

Embora o controle da freqüência cardíaca em portadores de fibrilação atrial (FA) esteja associado a desfechos similares comparado ao controle do ritmo cardíaco, o nível ideal de freqüência cardíaca na FA controlada ainda é desconhecido. As diretrizes atuais recomendam o controle rígido da freqüência cardíaca, embora não existam estudos que suportem esta hipótese. O estudo RACE II investigou se o controle permissivo da freqüência cardíaca seria não inferior ao controle rígido em pacientes com FA permanente.

Objetivo: Controle da freqüência cardíaca permissiva é não inferior ao controle rígido em pacientes com FA permanente.

Métodos: Pacientes com FA foram randomizados para controle permissivo da freqüência cardíaca (freqüência alvo em repouso < 110 bpm) ou controle rígido (alvo de freqüência cardíaca em repouso < 80 bpm e < 110 para exercícios moderados) A freqüência cardíaca foi controlada com o uso de betabloqueadores (45%), bloqueadores de canal de cálcio não-diidropiridinicos (6%) ou digoxina (7,2%) ou uma combinação deles. Um pequeno número de pacientes também recebeu sotalol (5,0%) e amiodarona (1,3%). Muitos pacientes recebiam inibidores de enzima de conversão de angiotensina (49,8%), estatina (28,8%), antagonistas da vitamina K (5,0%) e amiodarona (1,3%) no momento da randomização.

Resultados: Um total de 614 pacientes foram randomizados, sendo 311 deles para controle permissivo e 303 para controle rígido. As características basais foram similares nos dois grupos. A freqüência cardíaca média de repouso foi 96 bpm. A duração média da FA nos pacientes era de 18 meses, enquanto a média da duração dos casos de FA permanente eram 3 meses. Doença cardíaca valvar encontrava-se presente em 20% dos pacientes. Aproximadamente, 56,7% dos pacientes tinham sintomas de FA e 1,8% tinham somente FA sem outras patologias. A maioria dos pacientes tinha escore CHADS2 de 0 a 1 (60,7%) e 13,4% tinham CHADS2 >2.

A média da freqüência cardíaca após a fase final do ajuste de dose era 93 + 9 bpm no grupo permissivo, quando comparado a 76 + 12 bpm no grupo de controle rígido (p<0,001). Somente nove pacientes em ambos os grupos tinham ritmo sinusal ao final do seguimento. A freqüência cardíaca alvo foi alcançada em 97,7% dos pacientes no grupo permissivo e 67% no controle rígido (p<0,001).

Somente 1,9% dos pacientes com controle permissivo e 75,2% com controle estrito tiveram freqüência cardíaca de repouso <80 bpm. Já durante atividade física, 72,6% dos pacientes com controle rígido atingiram freqüência<110 bpm. Cerca de metade dos pacientes do grupo estrito não puderam atingir a freqüência cardíaca alvo devido a eventos adversos ou outra causa que não teve correlação com uso das drogas.

A incidência acumulada em 3 anos para o desfecho primário (morte cardiovascular, hospitalização por insuficiência cardíaca ou acidente vascular encefálico, embolismo sistêmico, sangramento maior, arritmia e implante de marcapasso permanente ou cardiodesfibrilador implantável) foi similar entre os dois grupos (12,9% versus 14,9%, Hazard Ratio 0,84, 90% CI 0,58-1,21, p para não inferioridade = 0.001). Isto foi verdadeiro para pacientes independente do escore de CHADS2. Estas foram, respectivamente, as taxas de desfechos secundários no grupo permissivo versus controle rígido: morte cardiovascular (2,9% versus 3,9%), insuficiência cardíaca congestiva (3,8% vs 4,1%), sangramento (5,3% vs 4,5%), sincope (1% versus 1%) e implante de marcapasso (0,8% vs 1,4%). A incidência de acidente vascular encefálico foi significativamente menor no grupo permissivo comparado ao grupo rígido (1,6% vs 3,9%, p<0,05).

Conclusão: Os resultados deste estudo indicam que uma estratégia de controle permissivo da freqüência cardíaca com um alvo em repouso < 110 bpm é mais facilmente alcançado em relação a uma estratégia de controle rígido, com um alvo < 80 bpm e em exercício < 110 bpm. A estratégia permissiva é também não inferior para desfechos cardiovasculares e está associada a uma redução da incidência de acidentes vasculares cerebrais.

O alvo da freqüência cardíaca foi conseguido somente em 67% dos pacientes com controle rígido. Portanto, é possível que outras maneiras de se conseguir uma freqüência cardíaca mais baixa pudessem exercer uma diferença no grupo de controle rígido da freqüência cardíaca. Além disso, a maioria dos pacientes neste estudo eram de baixo risco (escore de CHADS2 0-1). Embora os investigadores não tenham notado diferença nos pacientes com CHADS2 elevado, poucos pacientes foram elegíveis para análise, o que necessita um estudo posterior a ser explorado.

Referências: Van Gelder CI, Groenveld HF, Crijns HJ, et al. Lenient versus strict rate control in patients with atrial fibrillation. N Engl J Med 2010;Mar 15.

Apresentado por Dr. Isabelle C. Van Gelder no ACC.10/i2 Summit, Atlanta, 15 de Março 2010.
 

HOME

DESENVOLVIDO PELA DIRETORIA DE TECNOLOGIA DA SBC - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS © COPYRIGHT 2010
SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA |
tecnologia@cardiol.br