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Estudo PARTNER (Coorte A) - Implante Percutâneo de Prótese Aórtica Demonstrou Resultados semelhantes ao Tratamento Cirúrgico para Estenose Aórtica em Pacientes de Alto Risco Cirúrgico

Autor: Dr. Antonio Bacelar e Dr. Henrique B. Ribeiro         

                    

Resumo: O Dr. Craig Smith ( chefe da cirurgia cardiotorácica da Universidade de Columbia, New York) apresentou o estudo PARTNER no congresso da American College of Cardiology 2011, que comparou a eficácia do implante percutâneo da prótese aórtica (TAVI) contra à cirurgia de troca valvar convencional em pacientes com estenose aórtica  e alto risco cirúrgico. O TAVI apresentou mortalidade semelhante ao término de 1 ano.

Introdução: A estenose aórtica (EAo) é uma doença insidiosa e de latência prolongada, com progressão rápida após o início dos sintomas. Nestes pacientes a taxa de mortalidade aproximada é de 50% em dois anos para pacientes não submetidos a cirurgia de troca valvar. Além disso, muitos desses pacientes apresentam alta taxa de comorbidades clínicas, fazendo com que o risco cirúrgico seja alto. Nesse contexto, o implante percutâneo de prótese aórtica (TAVI) vem se desenvolvendo nos últimos anos, e em pacientes com contra-indicação para cirurgia, o TAVI demonstrou excelentes resultados com importante redução de mortalidade.

Objetivo:  O objetivo do presente estudo foi comparar TAVI contra cirurgia de troca valvar convencional em pacientes com alto risco cirúrgico.

Métodos: O estudo PARTNER (The Placement of Aortic Transcatheter Valves) é um ensaio multicêntrico, randomizado, aberto, onde participaram  26 centros nos Estados Unidos e Canadá. Foram incluídos pacientes com estenose aórtica importante com alto risco cirúrgico, definido por escore de risco do STS ≥ 10% ou escore de risco com mortalidade predita ≥ 15% em 30 dias. Como desfecho primário, foi avaliado óbito por qualquer causa e o desfecho combinado de óbito por qualquer causa ou re-hospitalização. Os desfechos secundários incluíram acidente vascular cerebral, sangramentos maiores e complicações vasculares.

Os pacientes foram randomizados comparando o implante percutâneo de bioprótese aórtica com pericárdio bovino via transfermoral (TF) contra cirurgia de troca valvar convencional. Os pacientes que não possuíam condições de acesso arterial periférico eram randomizados para cirurgia convencional versus implante de prótese via transapical (TA).

Resultados: Um total de 699 pacientes idosos de alto risco cirúrgico foram randomizados para TAVI ou cirurgia. A média etária foi de 84,1 anos. O grupo TAVI incluiu 348 pacientes (244 TF e 104 TA), enquanto que 350 pacientes foram alocados para o grupo cirúrgico. As características dos pacientes foram semelhantes em ambos os grupos, entretanto o grupo de pacientes submetidos à TAVI pela via transapical tiveram um perfil de risco ainda maior.     A taxa de mortalidade aos 30 dias foi menor no grupo TAVI em relação à cirurgia (3,4% vs. 6,5%; p=0,07) e a melhora dos sintomas ocorreu de forma mais rápida no grupo TAVI. Entretanto, a sobrevida ao término de 1 ano foi similar entre os grupos (24,2% TAVI vs. 26,8% grupo controle; p = 0,44), assim como a melhora da classe funcional. A taxa de AVC com sequelas foi maior no grupo TAVI aos 30 dias (3,8% vs. 2,1%, respectivamente; p= 0,20) e aos 12 meses (5,1% vs. 2,4%, respectivamente; p = 0,07). Ao término do primeiro mês, as complicações maiores relacionadas ao acesso vascular foram mais prevalentes no grupo TAVI (11,0% vs. 3,2%, respectivamente; p < 0,01). Entretanto, houve importante redução no grupo TAVI nas taxas de sangramento maior (9,3% vs. 19,5%, respectivamente; p < 0,01) e fibrilação atrial de início recente (8,6% vs. 16,0%, respectivamente; p < 0,01). Por fim, a taxa de regurgitação paravalvar ocorreu de maneira mais importante no grupo TAVI aos 30 dias e ao término de 12 meses (p< 0,001, para ambas as comparações) .

Figura. Resultados do PARTNER, baseado nos slides apresentados no ACC11.

Conclusão: O implante percutâneo de prótese aórtica apresentou mortalidade semelhante à cirurgia de troca valvar convencional em 1 ano.

Perspectivas: Doença cardíaca valvar mais freqüente no mundo industrializado, a EAo tem prevalência dramaticamente elevada com a idade. A prevalência da EAo é crescente, particularmente pela etiopatogenia degenerativa, relacionada ao envelhecimento populacional. O aumento da média etária da população é fenômeno mundial, presente no Brasil. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2050, estima que brasileiros com idade superior aos 75 anos de idade representarão 10% do total populacional. Estudo ecocardiográfico de prevalência da EAo, concluiu que aproximadamente 3% da população acima de 75 anos apresenta EAo grave de etiologia degenerativa. A soma destes pacientes àqueles portadores de EAo das demais faixas etárias e etiologias, torna a EAo uma questão de saúde pública, o que aumenta o interesse em seu estudo.

A história natural da EAo caracteriza-se por um longo período de latência clínica com baixa morbimortalidade, durante o qual o paciente é assintomático. Após o início dos sintomas, a taxa de mortalidade é de aproximadamente 25% ao ano.

Na grande maioria dos adultos, a substituição da válvula aórtica é o único tratamento eficaz para a estenose aórtica sintomática. A substituição cirúrgica da válvula aórtica resulta na melhora clínica e hemodinâmica dos pacientes, mesmo nos casos com disfunção ventricular.

Os idosos portadores de EAo grave apresentam algumas peculiaridades que tornam mais complexas a tomada de decisão terapêutica, como: maior incidência de coronariopatia,  múltiplas comorbidades que influenciam na qualidade de vida e pioram os resultados cirúrgicos e maior dimensão clínica do risco para operação não-cardíaca.

Aproximadamente 30% dos pacientes idosos portadores de EAo grave sintomáticos, ou seja, com indicação cirúrgica, deixam de ser operados devido a risco cirúrgico elevado. Recentemente, tem-se desenvolvido técnicas menos invasivas para tratamento da EAo grave sintomática. A mais utilizada e difundida mundialmente é o implante percutâneo de prótese aórtica, realizada pela primeira vez em 2002 por Alain Cribier (Rouen, França).

O implante pode ser realizado através da via anterógrada pela artéria femoral (via transfermoral) ou através da região apical do ventrículo esquerdo (via transapical). A técnica mais utilizada e considerada padrão ouro é a via transfemural. No entanto, uma importante limitação ao implante percutâneo utilizando a via TF  são as complicações vasculares, presentes em aproximadamente 10% dos casos, contribuindo com piora no prognóstico dos pacientes.  A via transapical é reservada para aqueles pacientes que apresenta vasculopatia periférica importante.  Vários estudos mostram a importância da curva de aprendizado com crescimento da taxa de sucesso do procedimento de 80% para mais de 95% nos últimos anos.

No ano de 2010, foi publicado a coorte B do estudo PARTNER, primeiro estudo randomizado comparando a eficácia e segurança da nova técnica ao tratamento conservador convencional (medicamentoso e valvuloplastia por cateter-balão) em pacientes considerados não candidatos ao tratamento cirúrgico (pacientes com mortalidade prevista >50% em 30 dias da cirurgia, por risco calculado, ou comorbidade irreversível importante). Este estudo conclui que o implante percutâneo de prótese reduziu a mortalidade absoluta em 20% e melhorou de forma substancial a qualidade de vida dos pacientes  ao caibo de 1 ano.

Os resultados da coorte A do estudo PARTNER, mostra mortalidade semelhante do TAVI em relação à cirurgia convencional, às custas de maiores taxas de AVC e de complicações vasculares. No entanto, os pacientes apresentam menores taxas de FA pós-operatória e menor necessidade de hemotransfusão. A consideração dessas complicações ainda enseja maior desenvolvimento de dispositivos de proteção cerebral e novos sistemas de entrega das próteses com menor perfil (atualmente 22F para Sapiens e 18F para Corevalve) para diminuir a incidência de AVC e complicações vasculares.

Respostas ainda são esperadas em relação à durabilidade dessas próteses e perfil hemodinâmico, pois até  o momento só existem estudos com acompanhamento de até 3 anos.

É importante salientar que foram incluídos apenas pacientes com EAo degenerativa. Portanto, não podemos generalizar esses resultados para pacientes com valva aórtica dita bicúspide e pacientes com EAo de etiologia reumática (ainda muito prevalente no Brasil).

Os resultados animadores do presente estudo fizeram com que o FDA autoriza-se o início de estudo randomizado analisando o implante percutâneo de prótese aórtica em pacientes com risco cirúrgico intermediário (SURTAVI).

O estudo PARTNER pode mudar a história do tratamento da EAo e alterar nossa prática clínica.  Uma importante questão a ser respondida no futuro é se, com técnicas menos invasivas, iremos expandir a indicação do tratamento da EAo crítica em pacientes assintomáticos.

Referência: Transcatheter Aortic Valve Implantation versus Surgical Aortic Valve Replacement in “High Risk“ Patients with Aortic Stenosis: The Randomized PARTNER Trial. Apresentado pelo Dr. Alan Cribier no ACC/i2-Summit 2011.

 

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